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<Evandro> Pequeno desabafo de sábado de manhã
Hmm. Olho meu futuro e vejo novos ares vindouros. Da última vez que o encarei de frente, ele me disse: "vais apodrecer em uma agência de publicidade até o fim de teus dias". Dei-lhe então uma rasteira e hoje sou metido a tradutor. Agonizo um pouco menos. Planejar o futuro soa mal aos meus ouvidos. Meu relacionamento com este senhor ranzinza e mal-humorado é um tanto caótico demais para se falar em planejamento. De vez em quando ele me ameaça com suas tragédias lentas de longo prazo, que no entanto são dotadas de uma estranha iminência de acontecer. Tento dar um pontapé nessa urgência discreta que rói a alma por dentro. Consigo e não consigo afastá-la. Presenteado com mais algum tempo antes do porvir, mudo um pouco a direção em que anda o velho ranzinza, e vou acertando o passo aos poucos. Já que tenho que seguí-lo, que outro remédio?
Parece então que a direção tem estado mais estável ultimamente. Só existe um problema, este parcial: minha amada - ser instável por excelência - exige cuidados e carinhos extremos, exibe conflitos e aflições para dar e vender, preocupa-se demasiado com meu/nosso futuro (preocupar-se demasiado com o futuro é um erro grave, é sempre bom lembrar), enfim, dá-me um certo desgosto. Mas eu disse parcial: a vida a dois é um desafio instigante, delicioso e muito belo, de que nem penso em fugir. Foge-se de tudo, menos do amor, que isto é errado, não se faz de jeito nenhum, é feio mesmo. O caminho é longo, o aprendizado a dois é cheio de obstáculos, internos e externos. Um não entende os gostos do outro; grandes amigos de um às vezes são apenas amigos "médios" do outro; um quer todo o tempo do outro, às vezes na hora errada. Em um país como o Brasil, acrescente-se a "exclusão cultural" (não me perguntem o que é isso, leiam meu blog instead) e todos os complexos psicológicos que impedem o indivíduo de lidar com ela. Amigos das mais diversas idades, menos da sua própria, é o que se faz aqui. Então vem o complexo da diferença. Por que não consigo me encaixar na "turma" dos meus semelhantes em idade? Essa pergunta, ela me fez um dia. O que responder? "São quase todos uns bostas", eu disse. "Fazer o quê?", completei.
Não tenho todos os amigos que gostaria de ter. Mas gosto de todos os amigos que tenho. Alguns não querem ser tão meus amigos quanto eu gostaria de ser deles. Outros têm hábitos que nem sempre se encaixam perfeitamente com os meus, portanto nem sempre são companhia para mim, ou para ela. Fico meio sozinho, não me importo, ouviria uma música ou leria um bom livro, mas ela se aflige e me chama. Eu vou, mas não adianta, a aflição não diminui.
Acho que assim é a vida. Aflições que nem sempre diminuem, felicidades que nem sempre aumentam, equilíbrio curioso que nem todo mundo entende.
</Evandro> <!--11:48 AM-->
<Evandro> Estou vendo surgir uma espécie de moda na Internet: muitos blogueiros estão apagando os arquivos de seus blogs, ou prometendo fazê-lo em breve. Quanto a mim, não vou apagar nada e também me recuso a ficar copiando arquivos de blogs e guardando-os em meu HD. Isso seria reconhecer um talento extraordinário que absolutamente não existe por aí. Há talentos desabrochando. Mas vaidades, também. </Evandro> <!--10:03 AM-->
<Evandro> "Forjando-me prócer, ouço de meu púlpito a ensurdecedora balbúrdia de meus conviventes, que me ignoram o cansaço – e o medo de tornar-me promissor para o resto da vida."
Sensacional!
</Evandro> <!--10:09 AM-->
<Evandro> Está chovendo ininterruptamente há três dias, e eu continuo sem ler jornais. Fui assistir a "Encontros e Desencontros", aquele filme supostamente sensacional da Sofia Copola. As pessoas que estavam comigo detestaram, em geral. Eu gostei. Entrei no clima do filme, por assim dizer. Viajei na lentidão melancólica com que a diretora descreve a velocidade japonesa. Bill Murray me faz sentir em casa. Assistir a um filme com ele é como chegar em casa depois de uma longa e cansativa jornada, tirar os sapatos, sentar no sofá e dizer olá aos meus pais e às minhas cachorrinhas. Ver japoneses cantando karaokê em uma sala alugada especialmente para isso é como sonhar aqueles sonhos em que você fica inerte diante de um perigo, sem conseguir se mexer, apático e deprimido e aflito ao mesmo tempo. Ainda assim, o filme não é sensacional. É bastante bom, e ponto.
Também fui ver "21 Gramas". Venci minha relutância em assistir a um filme do mesmo diretor de "Amores Brutos", um filme tão cruel, tão amargo, tão absurdamente apelativo. Acho que a maior fonte de inspiração do diretor deve ser o mito de Prometeu, o sofrimento eterno, inevitável, que tudo domina e a tudo se sobrepõe. Que outra explicação pode haver para alguém que mata 15 cachorros de uma só vez, no mesmo filme? Um filósofo francês disse que a vida é como uma cerveja: gostosa e amarga ao mesmo tempo. Em "Amores Brutos", a vida não é uma cerveja. É uma vitamina de bosta com açúcar mascavo e vinagre. Em "21 Gramas" ao menos o diretor amadureceu um pouco e conseguiu mostrar um certo sentido, um certo mistério por trás da vida, que se a torna injusta e cruel, não deixa de lhe conferir bondade também. Os atores estão todos perfeitos, um verdadeiro show de culpa e agonia, mas sempre em busca de algo além, uma superação no verdadeiro sentido da palavra: um ir além cheio de seqüelas, uma cura existencial cheia de cicatrizes profundas. E a fotografia é impecável (como de resto também a de "Amores Brutos"). Primeiríssimos planos do início ao fim me fizeram lamentar ter me sentado na segunda fileira. Valeu Sue, Stella e Henrie pela companhia!
</Evandro> <!--9:55 AM-->
<Evandro> Já faz 3 meses que não vejo o Lula na TV, um mês que não leio jornais, 2 meses que não assisto a noticiários. Hoje estou gravando uma coletânea de "flashback" (estilo "Antena 1 FM"). Além disso, estou lendo "O Senhor dos Anéis" em inglês (por falar nisso, a tradução me pareceu meio pobre) e dormindo nas horas vagas.
Estou de férias. Não quero saber de política. Política, para mim, acabou no dia em que Frodo Nine Fingers de Guaranhuns assumiu o "poder". E olha que naquela época ela (a política) já andava mal das pernas! Hoje o que resta nesse país é um circo de ex-guerrilheiros bonzinhos e simpatizantes diversos (o leque deles se torna cada dia mais abrangente). Um inferno de espertinhos (quase toda a população), que tiram vantagem uns dos outros a cada oportunidade, acusa os políticos de serem responsáveis pelos males do Brasil e – pasmem! – do mundo. E eu digo duas coisas (para o Brasil e para o mundo, respectivamente): [1] cada povo tem o governo que merece; [2] o ser humano tem o governo que merece.
Então resolvi me isolar. Agora só ando por estradas de pista dupla (de preferência com pedágio), de vidro levantado e ar-condicionado ligado quando faz calor. É claro que isso restringe meu alcance. Posso rodar apenas dentro do estado de São Paulo e ir, no máximo, até BH, Uberaba e Rio de Janeiro. Mas não me importo. Prefiro assim, pois cada buraco que vejo me lembra de seres barbados e roucos clamando por justiça social e exigindo que tudo fique nas mãos do Estado. Eles deveriam cuidar dos buracos, para que as carretas não se estragassem tanto, tornando o transporte tão caro. Mas não fazem nada disso, e ainda cobram milhares de impostos que não adiantam de nada. No fim, a única solução é pagar pedágio (sobreposto aos impostos de transporte, é claro!). E ainda temos que dar graças a Deus porque o governo do estado de São Paulo um dia admitiu ser incapaz de cuidar de buracos.
Este foi apenas um exemplo. O Meira Penna disse que São Paulo vai virar uma ilha capitalista, responsável pelo sustento de um país socialista inteiro, exatamente como ocorre na China. Estou com ele e não abro. Será que é por isso que tanta gente está vindo para cá? Enquanto Brasília incha e fica cada dia mais suja e cheia de mendigos, aqui as praias ficam lotadas de ex-pobres que hoje têm um emprego e vão se divertir no litoral sul. Como isso só acontece aqui, os engarrafamentos crescem a cada dia. Já estou vendo barbudinhos dizendo: "precisamos distribuir essa riqueza". Sim! Vamos "distribuir" a riqueza dos ex-pobres. E também a dos futuros ex-pobres. Afinal não é isso que o Estado vem fazendo desde o dia em que alguém o inventou? Tirando dos ex-pobres e dando aos pobres, para que todos continuem pobres!
Acho que este texto pode ficar como um tributo ao aniversário de São Paulo. Parabéns, São Paulo. Espero que um dia tirem de seus ombros este fardo, e que suas fronteiras – com as devidas exceções - um dia deixem de coincidir com as da civilização brasileira.
</Evandro> <!--10:06 AM-->
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